Estudante da UESB é condenada a prisão por fraude em cotas no curso de Medicina

Uma estudante do curso de Medicina da UESB (Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia), campus de Vitória da Conquista, foi condenada nesta quarta-feira (30) a dois anos de prisão em regime aberto (mais multa) por ter feito uma falsa declaração de endereço com o objetivo de ingressar no curso por meio das cotas reservadas a estudantes quilombolas — descendentes de escravos.

Na decisão, o juiz Clarindo Lacerda Brito diz que a estudante M. A. O. F. “agiu com culpabilidade normal à espécie”. Ao avaliar os antecedentes da estudante, o magistrado decidiu substituir “a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, quais sejam, a de prestações de serviços à comunidade e de prestação pecuniária, por se revelarem mais adequadas ao caso”.

M., que ainda pode recorrer da decisão e não foi localizada para comentar o caso, foi denunciada em 2014 pelo MPE (Ministério Público Estadual). Na declaração falsa, ela informou que morava no povoado da Rocinha, zona rural de Livramento de Nossa Senhora.

Em Vitória da Conquista, já como estudante, ela residia no bairro Candeias, área nobre da cidade. O juiz negou o pedido do MPE, autor da denúncia contra a estudante, para que como efeito da condenação M. tivesse a matrícula anulada pela UESB.

Cláudio Lacerda Brito achou por bem oficiar a própria universidade para que ela tome as providências. A UESB foi procurada e ainda não deu retorno ao blog. M. ainda continua como estudante da universidade.

Durante a fase processual, “apesar de a ré [M.] ter afirmado não serem verdadeiras as imputações que lhe eram feitas, afirmou que sabia que aquela declaração inserida com relação ao seu endereço não era verdadeira.”

“A ré, ainda, tenta justificar sua atitude, no sentido de demonstrar que teria direito à cota reservada a residente/domiciliado em comunidade quilombola, pois nasceu no Distrito de Iguatemi, onde existe uma outra comunidade quilombola denominada Olho d’Água do Meio, situada na zona rural de Livramento de Nossa Senhora”, revela uma parte dos autos.

“Afirma que residiu nesse Distrito de Iguatemi até o sete anos de idade, quando mudou-se para Livramento de Nossa Senhora, e que seu genitor é associado à Comunidade Quilombola Povoado da Rocinha, mas admitiu que neste Povoado não residiu. Vejamos: que não morou nesta comunidade (Rocinha), mas até os sete anos morou em Iguatemi, onde está localizada a comunidade quilombola Olho d’Água do Meio, e seu pai foi um dos fundadores dessa comunidade (Rocinha)”.

O advogado da estudante, Marlon Nogueira Flick, disse que ainda não foi oficialmente comunicado da decisão, mas que vai recorrer da mesma. “Vamos analisar os fundamento dos juiz para a condenação e a partir daí ver de que forma podemos fazer a defesa para recorrer”, declarou Flick.

Segundo consta no processo, “no dia 20 de agosto de 2013, a denunciada apresentou requerimento de matrícula junto à Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia a fim de ser ver matriculada no curso de Medicina daquela Universidade, tendo para tanto feito uso de documento que sabia conter informação falsa”.

“Na mesma oportunidade, a denunciada ainda inseriu informação falsa em documento público de requerimento de matrícula da Universidade Estadual da Bahia. Consta na peça informativa que a Denunciada, quando fez sua inscrição para prestar o vestibular na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, optou pelo sistema de reserva de cotas adicionais para o grupo de quilombolas”, relata a promotora Carla Medeiros.

Após a sua aprovação, M., a fim de ver realizada a sua matrícula, “apresentou declaração da Presidente da Associação do Desenvolvimento Comunitário Cultural Educacional e Social do Quilombo de Rocinha e Região, que informava que ela residia no Povoado Rocinha, documento em que se fez constar declaração falsa, visto que a acusada não residia naquele local”, segundo diz a promotora.

Além disso, “a Denunciada preencheu a ficha Requerimento – matrícula vestibular”, em que declarou residir no Povoado da Rocinha, localizado na cidade de Livramento de Nossa Senhora, informação que alterou a verdade sobre fato juridicamente relevante, uma vez que a denunciada só pôde se matricular pelo sistema de reserva de cotas porque mentiu acerca do seu local de residência”.

Nos autos do processo há relatos de moradores do povoado da Rocinha, em Livramento de Nossa Senhora, dando conta de que M. não morava no local. Um deles é Maria Regina Bomfim, Presidente da Associação do Desenvolvimento Comunitário Cultural Educacional e Social do Quilombo de Rocinha e Região.

Eis a declaração de Maria Regina nos autos do processo: “que é presidente da comunidade quilombola da Rocinha e Itaguassu, e fica localizada na zona rural do município de Livramento, e conhece M. e os pais desta; 00:44 segundos: que eles não residem na comunidade, não moraram na comunidade e não têm terra lá; 05:18 minutos: que a família de M. mora na cidade, e hoje ele (pai dela) trabalha vendendo moto”.

Questionada sobre o motivo de Maria Regina não ter sido punida por ter dado a falsa declaração, a promotora Carla Medeiros informou que se ateve apenas ao uso de documento falso para ingresso na universidade, e que o delito de Maria Regina deveria ser analisado pelo foro de Livramento de Nossa Senhora.

O Portal Livramento, em respeito ao princípio constitucional da presunção de inocência, vez que ainda cabe recurso da decisão de 1º grau, deixou de publicar o nome da estudante e de seus pais.

 

Fonte - Suiça Baiana